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sábado, 24 de novembro de 2012

Três séculos e meio de Correios

Revista Prefeitos e Gestões - Entrevista Wagner Pinheiro

Rodrigo Bruder

Todos os dias, 21 mil veículos e cerca de 60 mil carteiros rodam aproximadamente um milhão de quilômetros para transportar 36 milhões de postagens (cartas, eletroeletrônicos, brinquedos, celulares) em 5.550 municípios do país, quase a totalidade do território nacional. Essa megaoperação de serviços postais capitaneada há mais de 43 anos pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) — popularmente conhecida como Correios— é tida como uma das maiores ações públicas de logística e comunicação do mundo. Não à toa, este ano o governo Dilma decidiu explorar ainda mais esse poderio da estatal para inseri-la numa nova era da modernidade pautada pela comunicação tecnológica, com vistas ao mercado interno e internacional. O plano estratégico para os próximos oito anos começará com projetos ousados a serem executados já a partir de 2013, quando os Correios vão celebrar 350 anos de existência. Isso mesmo. São três séculos e meio de serviços principiados na época do Brasil colônia, que datam de 25 de janeiro de 1663, antes da vinda da família real ao país, cm 1808. De lá para cá a estatal passou por diversas reformas. E agora visa modernizar-se para se consolidar como mais uma ferramenta estratégica do governo para alavancar o crescimento econômico e a distribuição de riquezas.




O economista e ex-bancário de carreira, Wagner Pinheiro, assumiu o comando desse processo de renovação em 2011, quando foi nomeado presidente dos Correios. Com aportes de R$ 4 bilhões previstos para serem investidos até 2015, o dirigente destaca as primeiras grandes ações da ECT: entrar no mercado exterior com uma gama de novos produtos e ativos, incluindo proposta para assumir a operação dos Correios de Portugal, explorar o segmento de serviços postais eletrônicos, transações bancárias e logística integrada, investir no ramo de transporte aéreo de correspondência, fazer parceria com operadoras de telefonia móvel para ofertar produtos com marca própria. Além de viabilizar investimentos no consórcio que deve construir o Trem-Bala (SP-RJ), com o objetivo de transportar seus produtos com exclusividade no futuro, e entrar também no segmento de seguros. O desafio é diversificar sem perder o foco de seus serviços exclusivos no país (carta, telegrama e correspondência agrupada) responsáveis por 54,3% do orçamento da estatal, que pretende chegar a RS 15,6 bilhões de receitas em 2012 com crescimento de aproximadamente 14% em comparação com o ano passado. "As mudanças que o governo da presidenta Dilma está fazendo nos Correios têm o objetivo de modernizar a empresa, quase que a reinventando. Olhamos para o cenário internacional e sabemos que os grandes Correios do mundo estão se transformando cm empresas de multi-serviços, porque têm uma capilaridade enorme. Ao aproveitarmos nossa capilaridade podemos difundir e levar mais longe as políticas públicas do governo, de maneira mais integral", sublinha Wagner.

Essa reforma tem como base a Lei 12.490/11 que estabeleceu o Plano Estratégico Correios 2020. Graças a essa legislação, a estatal poderá operar no exterior, em segmentos eletrônicos, financeiros e de logística integrada, estabelecer subsidiárias, controlar ou ter cotas de participação acionária em empresas privadas, entre outras ações. O presidente dos Correios observa ainda que o parâmetro do governo brasileiro para esse processo de internacionalização são as atividades do Poste Italiane — correio italiano dono do maior banco estatal do país com operações no ramo de pagamentos via celular —, e a empresa alemã Deutshe Post, privatizada em 1995, e proprietária da gigante DHL. "Olhar para o mundo não é à toa. Os brasileiros estão fora do Brasil. Estão viajando ou morando lá fora. Os brasileiros importam produtos e serviços do exterior. Hoje são 50 mil pequenos pacotes que chegam por dia no nosso centro de encomenda internacional, em Curitiba. São celulares, brinquedinhos, compras feitas pela Internet. Há três anos eram 15 mil. Temos as nossas empresas para exportar, e queremos abrir ainda mais as portas do mercado internacional", ressalta.

As experiências internacionais que não deram certo também devem ser consideradas. Um exemplo disso, lembra Pinheiro, é a crise do United Satates Post Service, fundado em 1775. O serviço americano de postagem vive um longo período de crise nas últimas duas décadas com prejuízos acumulados em 2012 estimados em US$ 8,4 bilhões. A empresa americana optou por não evoluir com outros serviços no mercado, deixando esses tipos de transações para o setor privado. Em 2011, os Correios registrou receitas de R$ 14,3 bilhões, e auferiu lucro de R$ 883 milhões. "Não somos uma empresa dependente do Tesouro", comenta. O dirigente dos Correios acrescenta que sua incumbência é elevar a empresa pública brasileira ao mesmo patamar do Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Petrobrás — estatais que são consideradas como um dos artífices das políticas públicas do governo federal. Wagner Pinheiro presidiu por oito anos a Petros (Fundação Petrobras de Seguridade Social), foi funcionário de carreira do Banespa, graduou-se em economia na Unicamp com especialização na USP e FGV, e militou na Federação dos Bancários da CUT-SP, entre os anos de 1995 a 1998. Ele recebeu a Revista P&G BR, com exclusividade, numa tarde de trabalho em São Paulo, no Hotel Renaissance, na Avenida Paulista. Com uma fala pausada e esclarecedora demonstrou entusiasmo com os novos projetos. "Decidimos diversificar nossa gama de produtos e ampliarmos a atuação para continuarmos sendo uma empresa de comunicação entre as pessoas, e não somente uma empresa entregadora".

Com as prefeituras e governos estaduais os Correios mantém convênios e parcerias de logística. Em São Paulo, por exemplo, é responsável pela entrega do programa Leve Leite há mais de três anos. De acordo com a Prefeitura, o programa serve mais de 900 mil alunos na Capital com 1.720.000 quilos de leite em pó distribuídos mensalmente. Em municípios de Minas Gerais a estatal faz entrega de remédios nos domicílios. A meta é atender a totalidade das cidades até o final de 2012, pois atualmente os serviços são disponibilizados em 6,3 mil agências próprias (12 mil pontos de atendimento no total) distribuídas em 5.550 municípios — até o final de 2012 os Correios pretendem inaugurar agências nas 15 cidades restantes no país.

Ainda no âmbito de parcerias com setores públicos, o Judiciário utiliza o sistema eletrônico batizado de V-POST. Os serviços iniciaram-se no Sul do país, e está presente em sete estados. As intimações e decisões dos Tribunais de Justiça são transmitidas eletronicamente pelos Correios ao destino, são impressas e entregues ao destinatário com Aviso de Recebimento. A estatal também faz o arquivo dos comprovantes de recebimento durante período acordado com os órgãos de justiça. Wagner observa que essa modalidade será adotada nos próximos meses pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

A visão de internacionalização dos serviços da ECT mira a oferta pública a ser feita pelo governo brasileiro no leilão de privatização dos Correios de Portugal. Em meio à crise financeira internacional a empresa pública portuguesa decidiu privatizar seus ativos para cooperar com o país que assumiu severos compromissos financeiros com seus principais credores mundiais: a União Europeia, o F1\41 e o Banco Central Europeu. O leilão deve ser concluído até o final deste ano. Além do Brasil, especula-se que há o interesse de empresas da Colômbia, entre outros investidores. O governo Duma prevê explorar a proximidade que mantém com Portugal, que vai além da história da colonização, e da união através da língua portuguesa. Nesse aspecto, a história revela uma curiosidade.

Vale lembrar que os serviços postais do Brasil remontam ao Regimento Real, onde a comunicação passava pela jurisdição do Correio-Mor do trono Português, em 1663. Com base em registros históricos, sabe-se que a primeira correspondência produzida no país fora feita dez dias depois do descobrimento, em 1500, e transportada pela rota marítima (navio-correio) com destino à sede da Colônia. Tratava-se dos relatos do escrivão Pero Vaz de Caminha e do médico e cosmógrafo João Farás, o Mestre João, que reportaram ao trono português tudo as notícias na nova terra descoberta. Após diversas reformas feitas nos Correios durante 350 anos de história, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) foi criada em 20 de março de 1969 pela Lei n°. 509, numa série de reformas na Administração Pública promovida pelo governo militar, que deu origem, também, ao Ministério das Comunicações. Nessa era de modernidade, os Correios visa disputar o mercado das telecomunicações. O principal projeto é ofertar telefonia móvel virtual a partir de parceria com operadores de telefonia. Wagner Pinheiro explica que a ideia é criar uma marca própria — como "Correios fone" ou "Correios celular"— para operar nesse mercado conhecido como MVNO (Operador Móvel Virtual, traduzido para o português). Para tanto, o Ministério das Comunicações está preparando uma regulamentação no setor que visa estabelecer normas para o pagamento de contas pelo celular. "É uma parceria virtual e ampla em tecnologia e processamento de dados, atendimento e entrega de produtos. No mundo a telefonia virtual costuma ser uma experiência muito exitosa, tem em média 10% do mercado de celulares. No Brasil, temos 256 milhões de celulares, isso significa que podemos atingir 30 milhões de usuários. É um serviço que vai crescer muito", diz Pinheiro.

Para agregar potencial em seus serviços nessa fase de modernização os Correios decidiram intensificar sua prestação de serviços como Banco Postal parceria com o Banco do Brasil, operação estratégica nas ações do governo federal que visam o crescimento econômico e social. Desde janeiro, os Correios disponibilizou suas 6 mil agências no país para ofertar aos clientes do Banco do Brasil de 5.253 municípios serviços diversos: abertura de contas, saques, depósitos, pedidos de empréstimos e produtos de crédito, pagamentos 'de contas, saldos, extratos, além de recebimento de aposentadorias e benefícios sociais do INSS. A estatal já atua nesse segmento desde 2001, quando celebrou parceria com o Bradesco. Em 2011, no processo de renovação dos serviços por meio de licitação (modalidade leilão) o BB ganhou a concorrência ao apresentar a melhor proposta, que, segundo Pinheiro, foi de RS 2,3 bilhões — RS 50 milhões a mais do que havia proposto o Bradesco. "Essa inclusão bancária é importante nos pequenos municípios, com mais de 20 mil habitantes, por exemplo, para fortalecer o comércio local e fazer o dinheiro circular melhor", diz Wagner Pinheiro. Um exemplo disso é a operação em Borá (SP), menor município do país, com 805 habitantes segundo o censo 2010 do IBGE.

Os Correios têm buscado não dispersar o foco da entrega expressa de correspondências, urna de suas principais atividades por excelência. Mercado bastante competitivo com disputa acirrada entre empresas privadas como as norte-americanas Fedex, UPS e a alemão DHL. O presidente dos Correios diz que a estatal tem melhorado gradativamente seu mais importante produto: o Sedex, criado há 30 anos. A companhia lançou esse ano uma versão chamada Sedex 12, com entrega garantida até às 12 horas do dia útil seguinte à pastagem. Ao todo, o produto oferta outras cinco modalidades: e-Sedex, Sedex 10, Sedex Hoje e Sedex Mundi.

Em meio a esse processo de modernização os Correios tiveram de negociar melhorias trabalhistas para seus funcionários durante greve que durou 16 dias, deflagrada em setembro. Atualmente a estatal conta com aproximadamente 120 mil postos de trabalho, a maioria (57 mil) formada pelos carteiros. E, estima que no ápice da paralisação 11.825 trabalhadores (9,8% do total) cruzaram os braços, a maioria composta por carteiros. Para evitar prejuízos com as operações, os Correios fizeram mutirões durante a greve. "Temos o compromisso com a melhoria do trabalho, e a convicção de que essa greve foi menor do que o ano passado, porque os trabalhadores já perceberam que estão sendo beneficiados pelos nossos projetos de melhoria de condições de trabalho. À medida que a empresa apresentar melhores resultados pretendemos dar melhores condições salariais para nossos trabalhadores", garante Pinheiro.

Os resultados desse processo de modernização da estatal já dão os primeiros sinais. Os Correios figuram no ranking das 20 empresas mais influentes do país, segundo pesquisa Thought Leaders 2012 — As Empresas Mais Influentes do Brasil. Na lista das empresas brasileiras, os Correios aparecem na 6a colocação. A constatação partiu de 200 brasileiros entrevistados entre 26 de julho e 10 de setembro. Na classificação geral com 100 empresas — incluindo o setor privado — os Correios ficaram em 170 lugar, cujo ranking é liderado pelo Google. A pesquisa Thought Leaders é realizada pelo instituto inglês YouGov mediante consultorias da lhe Leadership Group e Ideal. Apresenta um balanço anual do ranlcing das empresas mais influentes na Europa, Estados Unidos, Ásia. Trata-se da primeira pesquisa feita no Brasil. Entre as 20 melhores empresas brasileiras 20, três são públicas (Correios, Banco do Brasil e Petrobras).

Em função dos grandes eventos esportivos que serão realizados no Brasil até 2016, os Correios têm atuado, também, como incentivador do esporte de alto rendimento. Até 2014 estima injetar aproximadamente RS 86,9 milhões no setor, com patrocínios (em negociação) de R$ 46 milhões para a natação, R$ 15,9 milhões para o Tênis, R$ 5 milhões vara o Handebol e patrocínio de R$ 20 milhões para o futsal. Além de apostar nos atletas, a estatal planeja se apoiar na sua experiência de ter sido a operadora logística do Pan Rio 2007 para assumir esse setor nos jogos olímpicos Rio-2016.

Publicada na edição de outubro/2012

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